NO FUNDO DO BOLSO
O Pocket vai acabar.
Esse site/app/serviço que funciona como um agregador de links, onde você pode salvar coisas pra ler depois, vai encerrar as atividades. Eu lembro que guardava muita coisa lá, pra ler quando desse tempo. A maior parte deles eu nunca abri nem li. Tempo, esse conceito complexo. As coisas continuam fluindo e se na vida normal coisas novas sempre vão chegando, com a internet nos nossas telas, é um jorro infinito e descontrolado de informação, nem tudo é relevante, nem tudo vai te fazer bem.
Eu sempre lembrava do Pocket, vendo o app e pensando “uma hora eu preciso entrar lá e dar uma olhada nas coisas”, e nunca o fiz.
As coisas que se perdem mesmo guardadas. No meu Pocket, empoeirados e defasados, estão links pra artigos que não existem mais, para matérias que era muito interessantes dez anos atrás, tanta coisa. O que parecia interessante ou necessário anos atrás e hoje já não faz mais sentido.
Às vezes isso me faz pensar na quantidade de coisas que a gente acumula, que fica guardada em gavetas, caixas e quartinhos. Esquecidas no fundo de um bolso de um casaco que você deixa no armário pra usar quando fizer frio, mas nunca faz frio o suficiente. Coisas que continuam tendo valores, mas que por não serem vistas, não são sempre lembradas ou acessadas. Às vezes é bom reencontrar essas coisas e fazer uma limpa.
Depois de ver uns 30 links (dos quais metade já não existiam mais), decidi deixar o Pocket pra lá. O que se perderá, se perdeu. Tanta coisa interessante veio e virá.
CHRIS WARE
No meio de tanta coisa guardada no Pocket, encontrei um link para um mini documentário sobre o Chris Ware, um dos maiores gênios dos quadrinhos estadunidenses. Eu não lembro de ter assistido anos atrás, mas hoje, com certeza, muita coisa bateu certo pra mim. Eu gosto muito de entender os processos internos, a vida real, os dilemas e formas de ver o mundo de artistas, e esse vídeo é um prato cheio.
“Eu chego à conclusão de que o processo real que acontece nos quadrinhos não é o de imagens com texto acompanhando. É um processo psicológico de ler imagens. É um sistema simbólico.” - Chris Ware
Chris Ware in Chicago, vídeo do Art21.
“Um livro em si é uma espécie de metáfora perfeita para um ser humano. Tem frente, tem costas. Tem uma coluna vertebral e é maior por dentro do que por fora.” - Chris Ware
Outro trechinho curto do Chris Ware pra Art21 aqui.
Não posso falar que sou um super fã do Ware, que acompanho de perto sua carreira, mas é inegável quanto ele é gigante no que faz. Acho que li Jimmy Corrrigan quando ainda não tinha muita maturidade pra entender, e confesso que, apesar de ter Buildibg Stories, nunca li inteiro (algo que vou remediar assim que estiver de volta ao Brasil com calma). Seu traço, que sempre achei que fosse digital, é 100% feito à mão, e PQP como ele é preciso, meticuloso. Seu processo leva tempo e está inserido numa rotina de vida real que se assemelha a um “emprego normal”, tem hora pra começar, hora pra terminar e é um fluxo contínuo de foco em diversos projetos que dialogam entre si. É cheio de questionamentos, dúvidas, minhocas na cabeça, como qualquer artista, também. É algo que traz um certo conforto, uma equalização com o que muitas vezes sinto. Cada um tem sua jornada particular, mas acho que a maioria de nós passa por coisas muito similares.
Tenho refletido muito sobre essas questões. Nem tudo dá pra implementar de uma vez na vida. De novo cada jornada é uma jornada. Cabe a cada um de nós entender e descobrir como construir esses espaços, porque não fazer a arte não é uma opção. Eu já passei tempos desconectado dela e posso dizer que não é legal. A gente volta, mas é um processo. Precisa, em alguns casos, alcançar de novo lá no fundo do baú aquelas coisas que a gente sabe que funcionam, o que inspira, o que motiva.
Melhor permanecer conectado.
AQUARELA
Esse ano, tive a oportunidade de fazer um curso de Aquarela ministrado pelo gigante Lee White, pela SVS Learn (escola online muito boa que acompanho há anos). Foi muito interessante. Apesar de já saber umas coisas básicas de aquarela, o curso me deu muitas novas técnicas e entendimentos.
Meu histórico com aquarela vai lá pra trás quando eu tinha 12 ou 13 anos e fazia aula com o Paulo Branco. Eu entendi o básico do básico e usava pra colorir meus desenhos. de super-herói como se fossem as cores dos gibis mesmo. Depois, na faculdade, tive aula de pintura com o Tuneu, focadas em aquarela, mas era uma época bem nebulosa e eu não tirei o proveito que poderia daquelas oportunidades. Meu estágio de licenciatura me levou novamente ao Paulo Branco, onde voltei a experimentar umas doideiras. Meu trabalho, no entanto, sempre foi muito voltado ao preto e branco, com linhas e texturas, hachuras e grafismos de quadrinhos e a aquarela meio que não cabia direito ali.
Aquarela é um treco interessante porque, de certa forma, vai ser o oposto do que eu costumo fazer hoje em dia: é líquido, no papel, usando pincéis que seguram muita tinta, não costuma depender de contornos nem linhas em preto e tudo acaba sendo difícil de prever e controlar, enquanto meu desenho é “seco” por ser digital e mesmo quando faço no papel, a tinta seca bem rápido saindo de canetas. Algumas até simulam pincel, e as uso há anos mas tenho ido pra um lado mais sintético. Bom, mas geralmente, o que faço é linha preta, bem definida, com contraste alto, digital e cheio de detalhes. Ah, vale dizer que a maior parte do que fiz no meu trabalho nos últimos 2 anos era arte-final em desenhos de outras pessoas.
Levei um tempo, enquanto gerenciava as aulas, lives e tarefas com todo o resto da vida, mas consegui terminar todas as tarefas essa semana! Sou hoje um aqurelista muito melhor do que era uns meses atrás, mas ainda longe de ser bom como gostaria. É preciso encontrar uma identidade, e isso vem depois/enquanto se pratica as questões técnicas. Isso leva tempo e precisa de espaço mental e físico. Aquela história das 10 mil horas é algo que faz muito sentido pra mim. Acho que vai ficando cada vez mais difícil de apreender algo novo e complexo conforme vamos ficando mais velhos, é mais confortável continuar produzindo da forma que já está mais dominada. E é boom, ao mesmo tempo, se desafiar, evoluir, expandir, se dando o tempo/espaço pra isso. Só tem a ganhar.
Esse é meu último trabalho/tarefa da aula:
Aqui estão dois retratos feitos depois das aulas, usando aquarela e lápis. Não são trabalhos 100% aquarela como aprendi no curso mas usei as técnicas aprendidas e o level subiu.
FALANDO EM CURSOS…
As matrículas para meu super curso de Arte-Final na INKO continuam abertas, e até o dia 15 DE JUNHO você ganha um DESCONTÃO. Confira AQUI para mis informações!
O curso propõe desenvolver as habilidades técnicas, estéticas e teóricas do aluno acerca da etapa de arte-final, momento crucial na produção de quadrinhos e demais artes gráficas, onde o desenho a lápis é finalizado. Apresenta os conceitos necessários para que os alunos entendam como funciona a arte-final e possam desenvolver autonomia e identidade, seja para arte-finalizar os próprios desenhos ou os de outro artista. A abordagem é um misto de teoria, análise crítica, produção e experimentação.
Quem sabe, ao longo do curso (que vai ter 20 encontros!) eu possa falar mais do Projeto INKS e mostrar mais coisas publicamente. Fazer quadrinho nesse sistema de work-for-hire, com uma equipe grande, pra um cliente graaaande, tem dessas. É quando eles querem, e a gente espera.
DA PRANCHETA
O quê? Quer mais desenho? Certo, lá vai: a primeira página do Sketchbook 68, feita durante a Cradle Con.
Depois de fotografar, achei que faltava alguma coisa:
Não é doido como algumas manchinhas brancas mudam completamente a imagem? Qual é sua favorita?
Para ler todas as edições anteriores:
ARQUIVO QUEBRA-CABEÇA