A Newsletter de hoje chegou mais cedo, por motivos de aniversário importante, HQ inédita, vídeo exclusivo e um papo sobre receitas antigas e comida congelada. Só pra você. Só vem.
Diário da Ausência - Parte 11
REQUENTAR O PRATO
É melhor do que não comer nada
Era pra escrever sobre a relação do meu trabalho com autobiografia e autoficção, mas algo muito interessante surgiu a sessão de terapia, então vamos lá falar sobre comida.
Antes de mais nada: eu estou muito feliz com Absence! Muito orgulhoso do resultado e querendo mostrar pra Deuzeomundotodo, falar dele, etc. É verdade que o processo de trazer esse livro pro mundo teve momentos de puro prazer criativo, outros de trabalho braçal, e outros de dúvida e receio.
Seria mais uma publicação de republicação, histórias já contadas que têm uns bons anos de idade. Já falei disso, mas hoje retomo a questão de estar trabalhando com histórias “velhas” em vez de estar criando coisas novas. Fazer Absence (todas as etapas) foi muito especial e importante porque me permitiu reconexões.
Reconectar comigo mesmo a partir de revisitar as HQs antigas foi o ponto mais forte. Indo contra a sensação de que isso seria trapaça, preguiça ou ego inflado, mergulhei numa pesquisa sobre mim e meu trabalho pregresso que renovou minha energia criativa. Revisitar o que me inspirava - não só as histórias reais que inspiraram as histórias e todas as lembranças paralelas, mas as trilhas sonoras, o momento no tempo, as mensagens liminares e subliminares, a poética… Até com a didática, porque também revisitei os assuntos que eu ensinava e com isso os reaprendi, atualizei e entendi, coisas novas que só vêm com maturidade, tempo e dedicação ao craft.
Mas, ainda assim, houve uma relação entre isso e requentar um prato de comida ao invés de cozinhar algo novo.
E a conclusão que veio bem fácil à mente nessa terapia é que é melhor requentar uma comida do que ficar sem comer - desde que aquela comida não te faça mal, claro. Na falta de algo 100% novo (seja por falta de ideia, mojo ou tempo), o que vivenciei retrabalhando Pieces para meus títulos gringos foi melhor do que não ter feito nada. Agora, algo que pode continuar meu amor por contar histórias, existe. Quadrinho não existe se não é lido, eu não existo como artista se não faço meu trabalho. E é melhor existir apresentando algo que já foi feito (ou uma nova abordagem disso) do que inexistir por falta do que mostrar.
Outra: Requentar ou refazer a receita? Na verdade, muitas vezes, ao requentar aquele prato você tem a chance de dar uma mexida, acertar o sal, colocar um salsinha, fritar um ovo pra por em cima, e, podendo trabalhar mais e de novo, melhorar o resultado. Quanto maior ua experiência, mais interessantes os resultados serão. Se não tem como criar algo novo, pelo menos trabalhar no que já existe, fazer algo a partir do que já existe, é melhor do que não fazer nada.
Quando redesenhei as HQs antigas, não sinto como se eu tivesse descongelado um prato antigo porque não são as versões originais antigas que estão no livro. Na verdade, foi refazer do zero a partir da receita original, mas não literalmente igual porque isso é impossível dadas as variáveis, das quais a mais importante é a maturidade e proficiência do cozinheiro. Pode chegar bem perto, mas nunca é idêntico (não trabalhamos com balança de precisão nessa cozinha). É um prato novo, uma experiência nova, geradas a partir de uma experiência pré-existente.
E esse processo pode reverberar. O que eu vou fazer com as histórias que eu já contei no Brasil enquanto eu estou aqui e ninguém nunca as leu? Tem um público imenso que eu poderia alcançar. É um trabalho a mais, envolve traduzir coisas, preparar pitches, enviar pra mil e uma editoras e agentes… Mas e aí, se eu confio no trabalho, não deveria duvidar. É só uma questão do trabalho braçal pra fazer isso chegar nos lugares de possibilidades. Claro, há sempre o diabinho no ombro querendo dizer que talvez essas histórias não foram mais longe pq no fundo não são boas de verdade, mas eu estou sempre me lembrando de dar um peteleco nele, puta cara chato.
Eu estou com várias ideias e elas vão bater de frente com o que já existe pra ser feito, o que está em andamento (mais prioritário) e o que eu poderia promover (muito trabalho pra pouco resultado?). Novos projetos vão ser questionados em termos práticos e financeiros, pra não dizer da autonarrativa (afinal, eu mal lancei um livro novo aqui, fiz um evento só com ele e mesmo o material do ano passado é sempre novo pra alguém, e já quero fazer mais um?). Estou em busca de viver mais o momento, porque já encheu o saco o looping infinito de tentar entender o que está pela frente. A energia criativa, hoje, está sendo nutrida com sessões de foco em coisa nova. Não quero arriscar voltar para um estado de inércia motivacional.
Talvez em um ponto de baixa energia eu questione a validade dos empenhos em fazer isso (como questionei em algum momento com todos os outros projetos). É preciso ter pelo menos um pé no chão (ou um lastro, sei lá), mas a eletricidade criativa que eu ando sentindo esses tempos é algo que eu queria manter o tempo todo, sabendo que a energia direcionada vai dar resultados positivos e continuar com uma coisa alimentando a outra. Às vezes com um prato muito bom requentado, talvez refazendo uma receita antiga com novas habilidades, talvez criando uma receita totalmente nova.
FALANDO EM ABSENCE 1
O novo vídeo do canal está no ar, mas só pra você: em primeira mão, antes de ir a público. Vou te mostrar Absence em detalhes, comentar umas curiosidades e refletir sobre a importância desse projeto pra minha criatividade - coisas que você conhece ser lê a Newsletter, coisas que podem ser novidade.
Aliás, o canal fez 5 anos essa semana!
FALANDO EM ABSENCE 2
O e-book está disponível na minha loja! Você pode adquirir a edição digital do meu lançamento pra ler onde quiser (PDF). Segue o link:
Ah, sim, está em inglês! Você gostaria de uma edição em português dos meus títulos publicados aqui fora? Diz aí!
13 ANOS DE PINGUINZAGEM
Essa semana, eu e a Monica comemoramos 13 anos juntos! Sou um cara muito sortudo por ter encontrado alguém tão especial, e muito feliz com nossa trajetória.
Faz muito tempo que eu ando reunindo ideias para finalmente começar a fazer as tirinhas d’A Vida Real dos Pinguins. Sempre fica pra depois, sempre falta o tempo e foco necessário pra me encontrar com o projeto. Eu lembro, no entanto, que é melhor fazer do que ficar parado. Melhor feito do que perfeito. Que a gente encontra o caminho enquanto caminha e por mais que tente mapear tudo e organizar, sempre tem algo no meio que pode ser adaptado.
Então, não sei se vou conseguir manter uma produção constante de tirinhas dessa série, mas sempre que eu fizer, vai ser com muito carinho e foco.
Aqui vai a primeira:
Achei que essa tirinha era a ideal pra “começar a série”, porque além de retratar um momento feliz nosso (o mundo real é complicado mas a gente sempre consegue se divertir), acaba sendo uma coisa meio meta: uma tirinha feita da ideia de fazer uma tirinha. E no final, a gente acaba nem sabendo do que eles (nós) estão rindo.
Espero que curta! Essas tirinhas vão sempre sair primeiro aqui, olha só que moral.
Bom, é isso! Nos falamos mais na próxima.
Para ler todas as edições anteriores:
ARQUIVO QUEBRA-CABEÇA